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segunda-feira, 10 de junho de 2013

Holloween capítulo 8


                 Capítulo 8
—Como assim dormir? - Kelly pareceu não acreditar na ideia.

—Juntar as pálpebras e esperar amanhecer. - Ben foi irônico enquanto tirava a pequena barraca de dentro da mochila.

—Eu não quero dormir... pode ser perigoso. - continuou ela.

—Não tem nada de perigoso aqui! Para de besteiras garota. - Paul se irritou.

—Então quem atirou aquelas pedras na gente? - esganiçou ela e Paul balançou a cabeça e sorveu um gole da bebida.


—Pelo menos estaremos protegidos do frio. - observou Ben, ao terminar de armar a barraca de tecido sintético verde escuro.

—É verdade... é melhor do que ficarmos aqui ao relento. - Eveline concordou, alisando o braço numa tentativa de se aquecer.

—Estou com fome... - disse Ben, atirando a mochila para dentro da barraca – queria um pedaço da torta de abóbora da minha mãe. - desejou.

—Também estou com fome.

—Eu também... - Eve juntou-se ao coro. O único sem fome parecia Paul que se ocupava de sua dose de vodcka.

—Então... vamos dormir. - propôs Ben e todos se olharam um instante.

—Certo. - disse Eve entrando na barraca e seguida por Ben.

—Não encoste em mim! - Kelly apontou para Paul que fez uma careta.

—Nem pensei nisso. - mentiu ele, guardando a garrafa no bolso.

Os quatro deram um jeito de deitarem encolhidos dentro do pequeno espaço. As garotas ficaram no meio e Ben passou o braço ao redor da namorada. O frio era bem menor dentro do aconchego da barraca e o cheiro de álcool que Paul havia bebido enchia o ambiente.

—Não está com frio. - Paul sussurrou no ouvido de Kelly que se encolhia para mais perto de Eve.

—Prefiro morrer de frio do que dormir abraçada com você! - ralhou ela.

—Então pode congelar aí, sua sem graça. - respondeu mordido.

—Idiota. - ela devolveu.

—Gente calma, vamos tentar dormir pra essa maldita noite acabar logo. - pediu Eve, tremendo de frio.

—Que horas são? - Paul perguntou, tentando ficar bem longe de Kelly o que era quase impossível naquele pequeno espaço.

—Uma e onze. - ela respondeu com medo de fechar os olhos.

—E eu jurando que há essa hora estaria curtindo a festa do ano. - observou Ben.

—E eu só quero que esta noite acabe, só isso. - murmurou Kelly fechando os olhos.

O mesmo desejo era compartilhado pelos outros; o fim daquela noite terrível. Logo todos se sentiam mais relaxados e Paul foi o primeiro a cair no sono, graças a ajuda das três latas de cerveja. Eve foi a única a não conseguir dormir, o silêncio da floresta a inquietava e o escuro era quebrado apenas pela lanterna de Ben que estava ligada acima da cabeça deles, apoiada em sua mochila. Eve olhava para ela se perguntando se seria melhor desligá-la, por um lado até que o escuro poderia ser seguro, mas por outro era assustador. Então se perguntou qual seria o tal perigo, eles só estavam perdidos, só isso. Mas ela culpava o lugar com fama de assombrado pelo medo que sentia.

A história das bruxas queimadas há mais de um século e as maldições que proferiram sobre a cidade era parte do medo. Mas é claro que o outro motivo era mais terrível. Black Water guardava o pior segredo da vida dos quatro amigos, mas nenhum deles queria ao menos pensar no assunto. Eve expulsou esses pensamentos da sua cabeça e fechou os olhos, era melhor tentar dormir um pouco assim como os outros. O som de suas respirações lentas e a respiração quente de Ben em sua nuca eram tranquilizadores. Ela se aconchegou melhor nos braços do namorado e espiou o relógio, já eram dez pras duas da manhã. Fechou os olhos e respirou fundo, porém quando estava sentindo o sono finalmente chegar, um tenebroso som fez seus olhos se arregalarem e sua respiração falhar. Lá fora, parecendo vir de bem longe, uma voz quebrava o silêncio entoando uma canção:




“Pela estrada afora eu vou bem sozinha / levar esses doces para a vovozinha / ela mora longe o caminho é deserto / e o lobo mau passeia aqui por perto/ Mas à tardinha/ ao sol poente / junto à mamãezinha dormirei contente.”




A voz de uma garota. E cantava de forma lenta e assustadora, mas parecia estar bem longe. Eve sentiu o corpo virar uma pedra de gelo, imediatamente as lágrimas de pavor encheram seus olhos. A cantiga cessou e nenhum dos três tinha despertado, Eve olhou para a lanterna e estendeu o braço de forma hesitante até conseguir pegá-la. Sentia medo de se mover, sentia medo de que... aquilo chegasse mais perto. Ela conseguiu desligar a lanterna que apoiou junto ao peito. Porém seu corpo começou a tremer violentamente, quando desta vez a cantiga soava um pouco mais de perto.




“Pela estrada afora eu vou bem sozinha / levar esses doces para a vovozinha / ela mora longe o caminho é deserto / e o lobo mau passeia aqui por perto/ Mas à tardinha/ ao sol poente / junto à mamãezinha dormirei contente.”




—O que foi Eve? - Ben acordou com os tremores violentos do corpo dela, a respiração ofegante e irregular fazia seu peito dar saltos fortes. Ben acordou quando a voz já tinha se calado – O que houve, por que está assim? - ele perguntou outra vez e os outros acordaram.

—O que foi? - Kelly perguntou.

—Não sei, Eve não está normal. - respondeu ele.

—Teve um pesadelo? - Paul perguntou pegando sua lanterna.

—Não, não liga isso! - ela pediu num sussurro desesperado.

—Por quê? - Paul estranhou e logo teve sua explicação, desta vez bem mais de perto.




“Pela estrada afora eu vou bem sozinha / levar esses doces para a vovozinha / ela mora longe o caminho é deserto / e o lobo mau passeia aqui por perto/ Mas à tardinha/ ao sol poente / junto à mamãezinha dormirei contente.”




Todos se olharam com os olhos arregalados. Ninguém ousava proferir uma única palavra, nem mesmo se mover. Kelly chorava baixinho enquanto escondia o rosto com as mãos.

—Essa não é a voz da...

—Cala a boca! - pediu Eve num sussurro.

Seus corações batiam tão forte que pareciam querer escapar do peito. Eles não poderiam mais ter dúvidas depois daquilo, não tinha como ser uma brincadeira ou um trote dos outros alunos. Ninguém sabia que o corpo de Cindy Lassier estava escondido em Black Water, somente eles sabiam e é claro... Cindy. Eles olhavam apavorados para as paredes da barraca em busca de alguma coisa, que não queriam ver. A lua cheia brilhava tão plena que seus raios pálidos atiravam as sombras retorcidas dos galhos das árvores sobre a barraca como vultos de braços tenebrosos.




“Pela estrada afora eu vou bem sozinha / levar esses doces para a vovozinha / ela mora longe o caminho é deserto / e o lobo mau passeia aqui por perto/ Mas à tardinha/ ao sol poente / junto à mamãezinha dormirei contente.”




Agora a voz soava desesperadoramente perto, parecia que quem cantava passava a apenas alguns metros da barraca. Kelly e Eve choravam de forma descontrolada, mas todos eles tremiam de horror.

—Quem está fazendo isso? - Ben sussurrou.

—Meu Deus... - Kelly soluçava.

—Calma. - disse Paul chegando mais perto, naquele momento eles se encolhiam um para mais perto do outro. O terror os dominava e todos sabiam quem era a única pessoa que entoaria aquela canção para os apavorar.

—É a Cindy... - Kelly sussurrou aos prantos, nunca tinha sentido tanto medo em toda sua vida.

—Ela está morta, Kelly. Não pode ser ela. - a voz oscilante de Paul soou.

—Eu quero sair daqui... - chorou Eve num murmúrio.

—Devemos estar ouvindo coisas, vamos ficar quietos. Calma... não é nada. - Ben sussurrou, apertando Eve que tremia descontroladamente.

Resolveram ficar no mais absoluto silêncio. E os minutos foram se passando sem que nada acontecesse, não havia mais som algum, nem mesmo vento soprando as folhas do chão, nem sequer um grilo. A noite havia se tornado tão silenciosa quanto um túmulo, ou melhor, Black Water havia se tornado em uma tumba. E os assassinos, agora temiam o poder fantasmagórico que não podiam mais negar existir ali. Imóveis ficaram durante uma hora inteira, ouvindo apenas o silêncio.

—Será que nós imaginamos tudo isso? - Paul perguntou.

—Eu ouvi... - sussurrou Kelly que escondia o rosto nos joelhos dobrados.

—Não é possível uma alucinação coletiva, tem alguma coisa lá fora. - falou Eve, batendo freneticamente um dos pés no chão.

—Bem... eu ainda acho que alguém está aprontando alguma para nós. - desacreditou Ben – planejamos pregar uma peça nos nerds ano passado e esse ano, fomos os escolhidos.

—E por que usariam o tema de Chapeuzinho Vermelho? Você sabe muito bem de quem era aquela voz! - Kelly insistiu.

—Deixa de besteiras, Kelly. Vai me dizer que acredita em fantasmas agora? - Ben provocou, mas ela não respondeu. - Ah é? Vou provar pra você que não é nada.

Falando assim, Ben largou Eve e se pôs em direção à entrada da barraca abrindo o zíper que a fechava. Eve e Kelly tentaram impedi-lo.

—Para, Ben!

—Não, Ben. Por favor não sai, não vai lá fora, por favor, por favor... - Eve implorava em prantos, mas ele se desvencilhou delas.

—Vou provar pra vocês que isso tudo é uma piada! - prometeu saindo da barraca.

—Volta, volta Ben. - elas pediam e Paul apenas olhava sem saber no que acreditar.

—Quem está aí? - Ben começou a gritar para o escuro, enquanto se afastava alguns passos da barraca – Quem é o idiota que está fazendo isso com a gente? Você é um imbecil, mostra a cara seu mané!

Ben gritava e sem perceber caminhava e girava enquanto tentava encontrar as tais pessoas que estariam brincando com ele e os amigos, talvez uma peça de Halloween. Na barraca, Eve e Kelly espiavam pela abertura. Paul engolia em seco, pensava que nunca tinha ficado em tal estado de pavor.

—Fala! Cadê você idiota?

Ben gritou mais uma vez e não ouviu nenhuma resposta, que não fosse o silêncio ecoando seus gritos. Aos poucos, a escuridão e o frio foram-no fazendo se dar conta do que estava fazendo. O medo foi se esgueirando por sua alma e ele achou melhor voltar para a barraca com seus amigos. Se voltou para trás afim de refazer os poucos passos que tinha se afastado, mas seu coração perdeu uma batida. Atrás dele havia apenas a floresta escura e intimidadora, não havia nem sinal da barraca. Nem mesmo o vulto dela ao longe... em nenhuma direção. Sua respiração falhou e um frio subiu por sua coluna, a lua cheia se escondeu atrás de uma nuvem e ele sentiu seu corpo se eriçar. Havia uma presença flutuando à suas costas.

—Ben, por que esses olhos tão grandes?

Uma voz baixa e arrastada, indagou atrás dele. Ben tinha certeza de que encontraria o responsável por aquilo tudo, virou-se devagar, como se o tempo estivesse em câmera lenta. Mas o que viu, o fez gritar apavoradamente.

—Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh.

O grito alto, forte e apavorado foi tudo o que os horrorizados Paul, Kelly e Eve ouviram na barraca.

—Beeeeeeeeeeeen! - Eve gritou – Beeeeeeeeeeeen! - aos prantos ela gritava pelo namorado e tentou sair da barraca, mas foi impedida pelos outros.

—Não Eve! Não vai, não vai por favor... Eve. - Kelly chorava, puxando a amiga pelo braço.

—Você não vai sair, Eveline. Não vai. - Paul a puxou com força e fechou o zíper, estava tremendo.

—Temos que ajudá-lo! - gritou ela entre um soluço e outro.

—Fala baixo baixo Eve, por favor, fala baixo. - Kelly pediu abraçando os ombros dela.

—Mas nós temos que ajudá-lo... Ben. - chorou ela tombando para o lado – Ben...

—O que aconteceu com ele, Paul? - Kelly olhou para ele com os olhos arregalados.

—Não sei, Kelly não sei... - respondeu ele com a voz falhada.

—Não é melhor ir-irmos atrás dele? - gaguejou ela enquanto Eve chorava descontroladamente.

—Ninguém mais vai sair dessa barraca enquanto não amanhecer – disse, engolindo em seco - à luz do dia saberemos o que fazer.

—Temos que encontrá-lo... Ben... - Eve repetia entre as lágrimas e Kelly alisava seu braço, numa tentativa de confortá-la.



Paul e Kelly se olharam assustados. Nunca tinham passado por uma situação tão terrível em toda a vida. Ficaram se olhando durante muito tempo, como se um encontrasse segurança no outro, Eve não cessou seus soluços durante horas. Mas nada aconteceu, a madrugada se manteve silenciosa e enfim, pelas quatro da manhã o sono os dominou. Abraçados e bem unidos, eles dormiram.

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